Hoje estava passando pela rua e vi um cão e uma
cadela cruzando. É engraçado como o pudor se faz ausente nesses animais. Na
realidade é ausente em todos os animais, há não ser, nos seres humanos.
Dificilmente veremos um humano se acasalando naturalmente no meio da rua, como
se fosse natural, como na verdade o é.
Voltei pra pensão, no intuito de buscar meu violão
que na noite anterior, encerei com todo capricho. Antes disso passei no bar pra tomar meu
remedinho. Uma receita caseira pra resfriado que meu amigo Manga ensinou. Dois
dedos de pinga com dois dedos de cinzano e meio limão espremido. Pra não omitir
nenhum fato, o resfriado já passou há uns três anos, mas o remedinho foi tão “bão”
que hoje eu tomo preventivamente, como vacina pra H1N1.
Depois de devidamente vacinado, fui embora mais
forte do que nunca. Cheguei à pensão faminto.
Na cozinha me encontrei com Tião Sorriso. Sujeito de bem com a vida,
sempre feliz, sorridente e totalmente da paz. Só que dessa vez encontrei-o caladão,
sozinho num canto, amuado. Como de praxe, não me fiz de arrogado e gritei:
- Fala ai Tião! Solta aquele sorriso pra mim! Ele
mal me olhou. Me aproxime e me sentei na
cadeira ao seu lado.
- O que aconteceu Tião? Nunca te vi assim. Ele me
olhou e em tom de confessionário me disse:
- Transei com uma quenga um dia desse e agora a “mulé”
não larga mais do meu pé. Eu tava meio “bebu“, e acabei trazendo ela pra
pensão. De noite, falei juras de amor eterno, tudo no “calô” do momento. Agora
eu não “guento” nem vê a cara da infeliz.
Fui até a geladeira, apanhei uma cerveja e mais
dois copos. Enchi os dois e disse ao Tião:
- Não entendo nada de relacionamento. Pra te ser
sincero nunca tive nenhum que durou mais de duas semanas. Mas sei observar a
natureza e uma coisa eu te digo Tião. Deus errou.
Tião arregalou os olhos e fez o sinal da cruz. –
Deus nunca erra Chico! Que prosa é essa? Retrucou.
- Mas dessa vez errou! Se me deixar explicar! Ele abanou
a cabeça e estendeu a mão como se me desse passagem.
- Você já viu dois cachorros transando? Tião
chacoalhou a cabeça afirmativamente. – Pois bem, depois que eles transam o que
acontece? Tião sorrindo disse: Ficam engatados por um “bão” tempo. Me enchi de
razão e afirmei com todo ar de meus pulmões. – Foi ai que Deus errou!
- Que blasfêmia “Homi”, num diga isso. Onde Deus
errou em deixar os “cachorrinho” engatado?
- Ele não errou em deixar os cachorros engatados, -falei
eu - na verdade ele devia fazer a mesma coisa com a gente. Tião não entendeu
nada, deu mais um gole na cerveja e falou: - “Ocê” já ta bêbado e fica dando “trabaio
pros otro”! Eu to aqui numa “agunia” danada e cê vem com esse papo mole!
- Pense
comigo Tião – falei com calma – Se você soubesse que ficaria engatado depois do
sexo com aquela mocreia, mesmo assim você teria comido ela? – Tião abriu o
velho e conhecido sorriso e disse: “Craro que não, se ta mais é loco”.
- Então! Dei um tapa nas costas dele, ergui o copo
num último trago e disse já saindo:
- É disso que eu to falando Tião! Deus errou!
Muito bom. Gostei da mameira filosófica aplicado ao conto.
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